quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Trade dress: STJ julga disputa entre duas empresas

A decisão é da 3ª Turma do STJ
Uma empresa que usa em seus produtos a mesma embalagem da concorrente comete crime de trade dress? Depende. Como a lei não trata especificamente do assunto, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a intervenção do Judiciário deve ser pontual, analisando as circunstâncias caso a caso.
O pano de fundo da decisão unânime do tribunal é a disputa entre as fabricantes das marcas de algodão Apolo e Farol por conta do conjunto-imagem de suas embalagens – expressão que engloba as cores, letras e disposição características de um produto ou serviço.
De acordo com a defesa da Apolo, autora da ação, a Farol, sua concorrente no mesmo segmento de mercado, passou, repentinamente, a utilizar embalagens que faziam “clara alusão ao produto” fabricado por ela, Apolo.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) tratou a questão como concorrência desleal – e condenou a Farol não só a parar de vender os produtos na embalagem da discórdia, como a pagar uma indenização de R$ 30 mil por reparação patrimonial.
A Farol recorreu ao STJ, alegando que a embalagem não tem registro no INPI, assim como não há registro dos elementos distintivos utilizados. E que, não havendo registro, não haveria proteção de marca.
Para o relator do recurso especial 1.353.451, ministro Marco Aurélio Bellizze, embora não seja disciplinado na legislação nacional, a proteção ao trade dress vem sendo garantida com base no dever geral de garantia de livre mercado – ou seja, “no dever estatal de assegurar o funcionamento saudável do mercado, de forma a expurgar condutas desleais tendentes a criar distorções de concorrência”.
Em sua decisão, Bellizze afirma que os limites concorrenciais introduzem conceitos imprescindíveis para a definição da amplitude da proteção da propriedade industrial. Mas que “não se pode admitir que a pretexto de se proteger o conjunto-imagem de um produto, se assegure o uso exclusivo e indeterminado de uma determinada funcionalidade não registrada, por exemplo”.
“Por incrementar a competição, a entrada de conjunto-imagem semelhante em mercado já assemelhado não deve ser obstada por meio de intervenção judicial. Esta deverá ser excepcional e sempre pautada pela verificação concreta de que se está diante de algo novo e peculiar a ponto de despertar o Estado de sua inércia, consequência da livre concorrência e da liberdade de iniciativa adotadas no Brasil”, defendeu o relator.
Confusão nos tribunais
Em seu voto, o ministro também apontou que é preciso fazer uma diferenciação entre o conjunto-imagem e os institutos denominados marca e desenho industrial. Essa distinção, segundo ele, é fundamental para definir o tratamento jurídico que será dado a cada caso e as “consequências advindas de condutas anticompetitivas praticadas em desrespeito a marca, desenho industrial ou conjunto-imagem”.
“Tem-se percebido uma confusão nas cortes locais quanto à utilização desses conceitos”, afirmou.
Bellizze lembrou que apesar de não ser questão inédita no STJ, o trade dress ainda é um tema consideravelmente novo e que tem provocado diversos questionamentos. Isso porque, “a despeito de seu reconhecimento pelos Tribunais brasileiros, não há a previsão dos requisitos necessários para sua proteção ou a previsão clara de sanção na hipótese de eventual lesão”.
De acordo com o ministro, a jurisprudência do STJ sobre a questão demonstra que, na maioria dos casos, a caracterização de afronta ao conjunto-imagem tem sido decidida, caso a caso, pelos tribunais locais. Por conta da Súmula 7, o que acaba acontecendo é que o STJ se restringe a manter as conclusões dos acórdãos.
Na interpretação do relator, o diálogo entre concorrência e direitos exclusivos decorrentes de propriedades industriais somente justificará a intervenção do Judiciário para afastar condutas concorrenciais que ultrapassem os limites da disputa legítima.
Esses limites estão, segundo Bellizze, “ora na confusão do consumidor decorrente de imitação desleal, ora na usurpação de vantagem alheia decorrente da associação de seu produto ou serviço com a prestação de seu concorrente, situação em que é notório o intuito de “pegar carona” no sucesso obtido pelo investimento de outrem”.
Na conclusão do ministro, o Judiciário não pode intervir para “meramente assegurar um direito de exploração exclusiva a bem não registrado na forma legalmente exigida”. Para o caso concreto da disputa entre as marcas de algodão, como não há registro da embalagem de nenhuma das empresas, o ministro considerou que “não se cogita da existência de um direito de exploração exclusiva, de modo que a vedação à utilização por alguma das partes depende mesmo da caracterização efetiva de ato de concorrência desleal”.
E que, por se tratar de supostas práticas anticoncorrenciais por meio da utilização de conjunto-imagem parecido, “deve-se reconhecer que o cerne do processo repousa em fato cuja caracterização depende, a priori, de conhecimento técnico especial não exigível de um juiz de direito, devendo, por isso, o juiz se servir do auxílio técnico de expert”. Assim, a Turma decidiu cassar a sentença que condenava a Farol e determinou o retorno dos autos à origem para a realização de uma prova pericial.
fonte: https://jota.info