Desenvolvida originalmente para detectar
pneumonia em carneiros, tecnologia da
Universidade Estadual do Colorado (EUA) consegue identificar o vírus, com
precisão, em mosquitos infectados
Passados três anos da provável data
de chegada do zika às Américas, os métodos de detecção do vírus ainda são
limitados. Se, por um lado, o RT-PCR (reação em cadeia da polimerase) — exame
considerado padrão ouro — é caro e exige máquinas sofisticadas, aqueles que
identificam anticorpos circulantes no organismo do paciente apresentam índices
altos de falso positivo e negativo. Na busca por meios mais baratos, rápidos e
acurados, um grupo de cientistas liderados pela Universidade Estadual do
Colorado (UEC), nos Estados Unidos, desenvolveu uma nova ferramenta
diagnóstica, com alto grau de precisão. Contudo, os estudos são preliminares e
não há previsão de quando vão para o mercado.
A equipe de pesquisadores, que contou
com a colaboração da Fundação Oswaldo Cruz de Pernambuco (Fiocruz-PE), utilizou
uma tecnologia preexistente, a Lamp, para identificar o vírus em mosquitos e
células humanas infectadas, provenientes de amostras dos Estados Unidos, da
Nicarágua e do Brasil. A técnica foi desenvolvida em 2001 por Connie Brewster,
autor desse novo artigo, publicado na revista Science Translational Medicine.
Originalmente, o pesquisador do Departamento de Microbiologia, Imunologia e
Patologia da Faculdade de Veterinária da UEC havia criado o método para
encontrar o vírus da pneumonia em carneiros selvagens.
A Lamp é semelhante ao RT-PCR, método
molecular que amplifica, detecta e quantifica o material genético de uma só
vez, o que aumenta a confiança do resultado do exame. Contudo, para examinar as
amostras pelo RT-PCR, é preciso usar um equipamento de laboratório que custa
entre US$ 15 mil e US$ 25 mil, o que inviabiliza ou, ao menos, dificulta o
acesso, especialmente em regiões mais pobres. Com o mesmo grau de
sensibilidade, a Lamp, por sua vez, não exige aparelhagem diferenciada: para
avaliar a amostra, basta uma máquina portátil e muito simples, o heat block,
que, além de poder ser transportado para qualquer lugar, custa cerca de US$ 200.
“Com o Lamp, não há necessidade de um
maquinário sofisticado”, destacou, em nota, o autor correspondente do artigo,
Joel Rovnak, da UEC. “A maior parte dos países que sofrem com os surtos de zika
não é rica, então, é importante tentar desenvolver métodos de vigilância em
saúde que possam, um dia, ser usados nesses locais”, destaca a estudante de
graduação da instituição norte-americana Nunya Chotiwan, coautora do artigo.
O custo não é a única diferença entre
os métodos. No caso do PCR, é preciso, primeiramente, extrair o RNA (material
genético do vírus) da amostra, um processo que não é simples. De acordo com
Chotiwan, quanto ao Lamp, os cientistas esmagam um mosquito na água. Depois,
retiram 2ml do líquido, colocam o material em um tubo de ensaio e o aquecem,
usando reagentes químicos. A amostra torna-se vaporosa e muda de cor. No estudo
da Universidade Estadual do Colorado, em 30 minutos, já se obtinha o resultado.
Contudo, a pesquisadora ressalta que, às vezes, é possível ter de esperar até
uma hora. Ainda assim, é um método diagnóstico em tempo real, tanto quanto o
TR-PCR.
Um outro importante resultado do
estudo é que esse método não produz falsos positivo ou negativo. Como o
mosquito transmissor do zika, o Aedes aegypti, também dissemina outras
arboviroses, incluindo dengue e chicungunha, a análise laboratorial pode acabar
confundindo o resultado, devido à semelhança desses vírus. Já os reagentes
usados no Lamp não identificam qualquer outro vírus, que não o zika.
Rovnak destaca também o fato de a
ferramenta conseguir distinguir a cepa asiática (a que causa microcefalia) da
africana (ainda não circulante nas Américas e, aparentemente, inócua). O vírus
proveniente da Polinésia foi detectado em Cabo Verde e espera-se que ele se
dissemine pelo continente africano. Segundo o pesquisador, é fundamental saber
diferenciar as variantes. “Originalmente, o zika foi detectado pela primeira
vez em Uganda, em 1947. Embora Cabo Verde seja um país insular, o Centro de
Controle e Prevenção de Doenças acredita que, rapidamente, ele chegue em outros
países africanos”, observa.
Com esse método, os cientistas
poderão identificar em que regiões há mosquitos transmissores do zika e, assim,
adotar medidas de controle e eliminação do vetor — o Lamp foi sensível suficiente
para encontrar um único inseto infectado entre 50 que não tinham o vírus.
Contudo, ainda é necessário aprimoramento, antes que o método esteja disponível
para detectar o zika em fluidos humanos. “O diagnóstico em humanos é um desafio
muito maior. Vai levar bastante tempo e muitos dados antes que agências
regulatórias considerem que esse é um meio seguro para diagnosticar pessoas que
têm os sintomas da doença”, ressalta Joel Rovnak.
Palavra de especialista
Limitações permanecem
“Hoje, os métodos de diagnóstico de
zika são muito limitados, principalmente porque a sorologia não é fidedigna e
pode ser confundida com a dengue. Essa tecnologia vem como uma alternativa mais
barata e mais rápida, embora também tenha algumas limitações. Nos testes com
cultura celular humana, houve muitos falsos positivos e falsos negativos. Por
isso, ainda é preciso aprimorá-la muito antes de poder ser usada em amostras
como sangue, soro, saliva e sêmen. E o exame para diagnóstico em humanos é
justamente o que mais precisamos nesse momento. O resultado desse estudo tem
implicação mais para a detecção do vírus no mosquito. Existe uma grande
possibilidade de o zika asiático, o causador da microcefalia, entrar na África.
Como essa técnica consegue detectar vetores infectados, ela ajuda a fazer o
controle do mosquito, com medidas mais específicas para a região onde for
encontrado.”
Fonte: http://www.diariodepernambuco.com.br