POR FRANKLIN GOMES
Em artigo publicado há
não muito tempo atrás intitulado “As Duas Faces do Avanço
Intelectual”, fizemos uma ligeira reflexão sobre o paradoxo entre a
eficaz e crescente evolução humana no campo da inovação (especialmente
tecnológica) e o retrocesso verificado na implementação ou mesmo
desenvolvimento das ferramentas (sejam legais ou operacionais) capaz de impor
respeito aos direitos relativos à propriedade intelectual, quiçá efetivamente
combatê-los.
Nesse ínterim, pouca
coisa efetivamente mudou, à despeito dos aplausos que merecem todos aqueles
envolvidos no combate aos delitos ligados à propriedade intelectual, em especial
as associações que representam diversos seguimentos da indústria, comércio,
autores, enfim, titulares de direitos intelectuais, que fizeram com que, ao
longo de anos de trabalho, boa parte da sociedade tenha se conscientizado da
gravidade do problema.
Esse trabalho, que
certamente ganhou visibilidade com a criação do antigo Comitê Interministerial
de Combate à Pirataria (no longínquo ano de 2001 — e que pouco ou quase nada
fez), foi certamente influenciado pela pressão exercida pelos EUA, que vez ou
outra ameaçava incluir o Brasil em lista negra, encabeçada por países como
China e Índia, tidos como países onde praticamente não há respeito à
propriedade intelectual (mas que já esboçam alguns avanços).
Vale lembrar que o
Comitê, apesar de criticas merecidas, serviu pelo menos para trazer o assunto
para a pauta da sociedade (auxiliando assim os titulares de direitos
intelectuais nas lutas diárias que enfrentavam nos tribunais Brasil afora), que
logo após assistiu a "Telemidiática CPI da Pirataria", que soprou
como uma esperança de dias melhores ou de um posicionamento diferente diante do
quadro até então vigente.
Nesse aspecto, apesar
do grande barulho, e talvez menor resultado, a criação do Conselho Nacional de
Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual — CNCP, em 2004,
conglomerando diversos segmentos da sociedade, deve ser reconhecido com um grande
resultado da CPI e, mais que isso, um campo legítimo e poderoso para dar vazão
a necessária discussão e contribuição para medidas práticas, educativas e
legislativas, no enfrentamento da questão.
De qualquer forma, o
CNCP, que encabeça o fronte contra a Pirataria (ao lado do também muito ativo —
Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade, como outras tantas entidades
engajadas no tema), representa uma das maiores ferramentas para enfrentamento
da questão, e onde muitos ainda depositam sua confiança de que, através da
força que reuniu, possa efetivamente mudar o quadro atual.
E para isso, já está
claro que não bastam medidas paliativas ou pontuais. Também não é a força
pitoresca e grotesca dos meios “históricos” de investigação brasileira que devem
nortear a questão. Novas leis, palestras, apreensões pontuais, a despeito de
positivas, não resolvem o problema. A reforma deve englobar as sólidas bases
onde permeiam os mecanismos do sistema de pirataria e, mais do que isso, do seu
próprio sistema de combate, maculado, em sua raiz, por problemas muito mais
sérios (lamentavelmente experimentados em outros campos), dos quais muitas
vezes se fazem valer as próprias vítimas e interessados, ofuscados pela
dificuldade em agir de outra forma.
Basta dizer que desde
2006, por exemplo, há lei no estado de São Paulo (Lei 12.279/06, regulamentada
pelo Decreto 50928/06) e na cidade de São Paulo, prevendo perda do cadastro de
inscrição no ICMS, fechamento do estabelecimento, impossibilidade de seus
sócios atuarem no mesmo ramo por 05 anos, perda do alvará de funcionamento do
estabelecimento, entre outras penalidades, para aqueles que forem flagrados
comercializando produtos piratas. Qual o resultado dessa lei? Quantos
estabelecimentos foram efetivamente fechados? A mesma legislação, aliás, começa
a pipocar em outras cidades e estados.
É, como se diz, tratar
o que existe, como existe, da forma que existe, pautado na legalidade, na
razoabilidade, mas acima de tudo, na realidade de um mundo em diária mutação. E
isso começa pela nomenclatura atribuída à questão. A sociedade,
lamentavelmente, por maior que seja o esforço em fazer crer que PIRATARIA é
alvo nocivo, criminoso, tem consigo um idéia diferente da questão. Há,
certamente, uma aceitação do termo, por maior que seja o avanço hoje
experimentado.
E a amplitude de crimes
que hoje são colocados sob a chancela de PIRATARIA parece trazer ainda mais
maleabilidade ou menor reprobabilidade social da conduta.
Talvez a intenção seja
justamente essa: colocar sob o manto da PIRATARIA crimes gravíssimos, como a
falsificação ou adulteração de medicamentos, ou mesmo de cosméticos, que são
crimes hediondos[1] (com
penas de até 15 anos de prisão), mas aparentemente o viés tem sido outro.
Tanto é que vez ou
outra há alguns defendendo a aplicabilidade do princípio da adequação social
(que não guarda amparo em nossa legislação) para afastar a punição de crimes
contra a propriedade intelectual (especialmente o comércio de CDs piratas).
De qualquer forma, à
despeito do coro que se faz pela avanço intelectual no enfrentamento da
questão, o objeto central aqui é anunciar mudanças legislativas e decisão do
STJ que promoveram alteração nos crimes contra a propriedade industrial (e
todos que se enquadrem na mesma condição), como veremos.
A
Prescrição nos Crimes contra a Propriedade Intelectual
Há muito tempo, tanto detentores de direitos ligados à propriedade industrial, como aqueles que lidam com o tema, entidades de classe, aguardam e reclamam pela aprovação de alteração na legislação que trata dos crimes contra a propriedade industrial, tipificados nos artigos183 a 195 da Lei de
Propriedade Industrial — Lei 9279/06.
Há muito tempo, tanto detentores de direitos ligados à propriedade industrial, como aqueles que lidam com o tema, entidades de classe, aguardam e reclamam pela aprovação de alteração na legislação que trata dos crimes contra a propriedade industrial, tipificados nos artigos
O clamor maior, e a
espera que aparentemente não se encerra, é pelo projeto de lei — PL 333/99, de
autoria do então deputado Antonio Kandir, cuja grande mudança é justamente
aumentar a pena culminada para tais delitos.
Uma das motivações era
justamente o reconhecimento de que a pequenez da pena máxima culminada para
aqueles delitos (que não passa de um ano de detenção) tornava, na prática,
impossível uma efetiva punição, quer por ser o crime atingido invariavelmente
pela prescrição, quer pela possibilidade de aplicação dos benefícios advindos
com a Lei 9099/95 — Lei dos Juizados Especiais (já que para muitos as condutas
em análise não são, ou não deveriam ser, condutas de menor potencial ofensivo).
No que pese o PL ainda
continuar sendo apenas um PL, recente modificação promovida no Código Penal,
(mais precisamente no último dia 05.05.2010) parece confortar (pelos menos
parcialmente) aqueles que temem a prescrição como um dos maiores vilões na
persecução criminal dos crimes contra a propriedade industrial.
Como sabemos, a
prescrição penal nada mais é do que a perda do poder e dever de punir do Estado
diante do não exercício da pretensão punitiva ou mesmo executória durante o
prazo estabelecido pela lei.
Em outras palavras,
poderíamos dizer que é uma espécie de “penalidade” aplicada pela lentidão do
Estado em exercer o direito de punir aqueles que transgridem o ordenamento
jurídico vigente. O resultado é a extinção da punibilidade do agente.
O seu reconhecimento,
portanto, atinge o próprio direito material (de punir), e conseqüentemente
fulmina o direito de ação. Boa parte dos doutrinadores acredita ser matéria
eminentemente penal, conquanto haja corrente que afirme ser processual e outra
mista.
De qualquer forma, a
prescrição se divide basicamente, em dois grandes grupos: prescrição da
pretensão punitiva e prescrição da pretensão executória. Ambas estão
disciplinadas no Código Penal, em seus artigos 109 a 117.
Importante termos em
mente que a prescrição da pretensão punitiva abarca diversas modalidades: i)
prescrição pela pena máxima em abstrato; ii) prescrição superveniente ou
intercorrente; iii) prescrição retroativa.
Fonte: http://www.conjur.com.br