sábado, 1 de maio de 2010

Fim da validade da patente do Viagra – Patente “Pipeline”

Uma questão que ganhou grande repercussão na mídia nacional nos últimos dias foi a conclusão do julgamento, pelo Superior Tribunal de Justiça, do Recurso Especial nº 73101, que tem como objeto a discussão quanto ao prazo de validade da patente do medicamento Viagra, usado no tratamento da disfunção erétil, de titularidade dos laboratórios Pfizer. Por maioria de votos, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, acompanhando o voto do Exmº Ministro Relator João Otávio de Noronha, decidiu pela extinção da patente em junho de 2010.

Primeiramente é importante destacar que não se tratou de “quebra” de patente devidamente registrada perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), mas de mera interpretação da lei quanto ao prazo de duração da patente de referido medicamento. Segundo a Lei de Propriedade Industrial Brasileira (Lei 9.279/1996), o registro de uma patente concede ao seu titular o direito exclusivo da exploração do objeto da patente pelo prazo de vinte anos. Ou seja, o titular da patente tem o direito de impedir que terceiros, sem o seu consentimento, possa produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar com estes propósitos o produto objeto de patente ou, ainda, o processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado. Após este prazo, a invenção cai em domínio público, sendo permitido a qualquer pessoa explorar e produzir tal produto. 
A patente do princípio ativo do medicamento VIAGRA foi concedida pelo sistema “pipeline”, previsto no art. 230 da Lei de Propriedade Industrial, que permitia ser depositado pedido de patente relativo às substâncias, matérias ou produtos obtidos por meios ou processos químicos e as substâncias, matérias, misturas ou produtos alimentícios, químico-farmacêuticos e medicamentos de qualquer espécie, bem como os respectivos processos de obtenção ou modificação, por quem tenha proteção garantida em tratado ou convenção em vigor no Brasil. Desta maneira, fica assegurada a data do primeiro depósito no exterior, desde que seu objeto não tenha sido colocado em qualquer mercado, por iniciativa direta do titular ou por terceiro com seu consentimento, nem tenham sido realizados, por terceiros, no País, sérios e efetivos preparativos para a exploração do objeto do pedido ou da patente.
Ou seja, o sistema “pipeline” de concessão da patente é um método excepcional de revalidação de patentes já concedidas em países estrangeiros. Através do sistema pipeline, fica assegurado ao titular da patente o prazo remanescente de proteção no país onde foi depositado o primeiro pedido, contado da data do depósito no Brasil e limitado ao prazo de vinte anos.
Segundo precedentes do próprio Superior Tribunal de Justiça sobre o prazo de proteção da patente “pipeline”, o termo inicial de contagem do prazo remanescente deve ser a data do primeiro depósito realizado no exterior, que seria o mais compatível com os princípios que regem a propriedade industrial. Tal interpretação decorre do fato de que o sistema “pipeline” de concessão de patente decorre da participação do Brasil como signatário do Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (TRIPS), incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro através do Decreto nº1.355/94.
Um dos objetivos do acordo TRIPS é o de uniformizar os padrões e princípios relativos à propriedade intelectual relacionados ao comércio. No artigo 33 de referido acordo internacional, está expresso que a vigência da patente não será inferior a um prazo de 20 anos, contados a partir da data do depósito da patente. Previu, ainda, que os países membros do acordo que não dispusessem de um sistema de concessão original poderiam dispor que o termo de proteção seria contado a partir da data do depósito no sistema de concessão original. È exatamente o caso do Brasil, quanto os produtos descritos no art. 230 da Lei de Propriedade Industrial.
Através do sistema “pipeline”, o registro, no território brasileiro, da patente do princípio ativo do medicamento VIAGRA se deu com base em patente depositada na Inglaterra em 20 de junho de 1.990. Assim, segundo a decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, considerando que o marco inicial da contagem do prazo vintenário de proteção é a data do depósito no país de origem, o mesmo expirará no próximo dia 20 de junho. Após referida data, não estando mais o princípio ativo do medicamento VIAGRA protegido pela exclusividade da patente, qualquer laboratório farmacêutico poderá produzi-lo. Ressalte-se que poderão ser produzidos medicamentos “genéricos” e/ou “similares” (Lei nº9.787/1999).
O medicamento “genérico” nada mais é do que um medicamento similar a um produto de referência ou inovador, que se pretende ser com este intercambiável, geralmente produzido após a expiração ou renúncia da proteção patentária ou de outros direitos de exclusividade, comprovada a sua eficácia, segurança e qualidade. Por sua vez o medicamento “similar” é aquele que contém o mesmo ou os mesmos princípios ativos, apresenta a mesma concentração, forma farmacêutica, via de administração, posologia e indicação terapêutica, preventiva ou diagnóstica, do medicamento de referência registrado no órgão federal responsável pela vigilância sanitária, podendo diferir somente em características relativas ao tamanho e forma do produto, prazo de validade, embalagem, rotulagem, excipientes e veículos, devendo sempre ser identificado por nome comercial ou marca. 
É da natureza da patente o prazo determinado de sua duração. De um lado o prazo de exclusividade na exploração do produto estimula o investimento em pesquisa para o desenvolvimento de novos produtos, garantindo o retorno financeiro do investimento feito. De outro, porém, passado o prazo legal de exclusividade, tal conhecimento passa a integrar o domínio público, levando o contínuo desenvolvimento da humanidade, em um verdadeiro circulo virtuoso. Pode-se concluir, portanto, que a decisão do Superior Tribunal de Justiça apenas aplicou ao caso concreto a disposição expressa da Lei de Propriedade Industrial.
por Gustavo Teixeira Villatore.
*Gustavo Teixeira Villatore é sócio-advogado do Escritório Katzwinkel e Advogados Associados
Fonte: http://www.paranashop.com.br/colunas/colunas.php?op=opiniao&id=20641